UTILIZAÇÃO PRÁTICA DO ELETROCARDIOGRAMA PARA AVALIAÇÃO E ESTRATIFICAÇÃO DE RISCO DA INSUFICIÊNCIA CARDÍACA
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APLICABILIDADE PRÁTICA DO ELETROCARDIOGRAMA

Por Paulo Ricardo Nauar, Médico Cardiologista Hospital Universitário João de Barros Barreto – UFPA

 Introdução

A função do eletrocardiograma (ECG), assim como de qualquer outro exame, além de facilitar o diagnóstico, deve ser a possibilidade de estratificação de risco e auxílio na definição de conduta, permitindo estabelecer uma estratégia baseada em resultados, aplicabilidade pré e pós-teste e associação indispensável com quadro clínico e perfil de cada paciente.

Num primeiro momento parece complicado, associar tantos dados e probabilidades, mas a prática clínica e treinamento específico, facilitam à tomada de decisão.

Um mesmo tipo de alteração ou marcador eletrocardiográfico, pode ter significados clínicos diferentes, dependendo de sua utilização e do perfil de cada pessoa que está sendo avaliada. Um eletrocardiograma normal, não exclui o diagnóstico de uma SCA, assim com nem todo BRE significa coronariopatia com necessidade de cateterismo.

Saber utilizar um exame tão importante na prática clínica, como o ECG, é mandatório para o médico, independentemente de ser ou não cardiologista. Outros profissionais da área de saúde, especialmente aqueles que atuam em situações de urgência e emergência, podem e devem estar familiarizados com o método.

  • Treinamento e prática clínica;
  • Utilização de marcadores eletrocardiográficos;
  • Avaliação de probabilidades pré e pós-teste;
  • Aplicabilidade prática e estratificação de risco;
  • Diagnóstico eletrocardiográfico;
  • Definição de estratégia, associada ao quadro clínico e perfil do paciente;
  • Tomada de decisão / definição de conduta.

Passo a passo pra utilização correta e otimizada do eletrocardiograma.

Metodologia prática

Para aproveitar ao máximo um método diagnóstico devemos seguir sempre uma metodologia prática. Com o eletrocardiograma não é diferente. Uma padronização, com uma sequência correta de avaliação deve ser respeitada.

  1. Medidas eletrocardiográficas.
  2. Descrição dos padrões eletrocardiográficos, com possíveis alterações morfológicas.
  3. Conclusão.

Seguir uma sequência lógica, descrevendo as alterações a partir da onda P, passando pelo segmento PR, qRS, segmento ST até a onda T e intervalo QT.

Buscar por alterações eletrocardiográficas mais frequentes e que tenham significado clínico.

Avaliação do ritmo

  • Saber se o ritmo é sinusal: avaliar a presença de onda P + em D1 e – em aVR, se onda P – em D1 diferenciar de troca de eletrodos (mais comum), dextrocardia ou rit. Juncional.
  • Avaliar ritmo atrial, juncional ou a ausência de ondas P.
  • TPSV (DVN // taqui-ortodrômica).
  • Presença de ondas f de fibrilação atrial ou F de flutter (dentes de serrote).
  • Taquiarritmia de complexo qRS largo (TV, taqui-supra com condução aberrante, taquicardia antidrômica e pré-excitação, taqui-sinusal com bloqueio), utilizar critérios de Brugada para diagnóstico de TVS.
  • Marcapasso (espículas), modo, comando e sensibilidade.

Frequência cardíaca

  • Taquicardia: FC > 100bpm.
  • Bradicardia: FC < 50bpm.

Outras arritmias / pausas

  • ESSV
  • ESV: de VD ou de VE. Características, localização e grau de complexidade.

Espaço PR

  • Longo: > 240mseg (BAV)
  • Curto: < 120mseg (pré-excitação)

Bloqueios átrio ventriculares

  • BAV 1° grau
  • BAV 2° grau (MI // MII)
  • BAV 3º grau (dissociação átrio ventricular), supra-his (QRS estreito) ou infra-his
  • 2:1
  • Avançado

Eixo elétrico (SAQRS)

  • Normal: entre -30° e +90°
  • Para esquerda: > -30°
  • Para direita: > +90°

Distúrbios de condução

  • Bloqueios divisionais (BDASE / BDPI)
  • Bloqueios de ramo: Direito / Esquerdo (1° 2° e 3° grau), características peculiares.

Sobrecargas de câmaras

  • SAE: P bimodal, Morris. FA permanente como sinal indireto.
  • SAD: P apiculada, deflexão rápida de P em V1, P pulmonalle, sinal de Peñaloza-Tranchesi.
  • SVE: Critérios de voltagem (Sokolow-Lyon / RV5-V6 + SV1 >35mm), R aVL > 11mm (Talbot), S V1 ou R V6 > 20mm ou R D1 > 15mm; Outros: SAE; ARV, SAQRS esquerda.
  • Critério de Cornell: R aVL + SV3 > 20mm em mulheres e > 28mm em homens.
  • Romhilt: 4 pontos sugestivo e 5 pontos diagnóstico.
  • Gubner-underleiger (R D1 + S D3 > 25mm)
  • Sokolow-Lyon modificado.
  • Koito (R V6>V5)
  • SVD: desvio do SAQRS para direita, Alterações de QRS em V1 (qR / rsR’), complexos RS ou rS em precordiais esquerdas, Sokolow – Lyon invertido (R V1 + S V5 / V6 > 10mm), ARV derivações direitas, S1 S2 S3.

Alterações de segmento ST

  • IAMCSST, localização e artéria comprometida. Extensão.
  • Pericardite
  • Repolarização precoce.
  • Infradesnível segmento ST, especialmente na estratificação de risco de dor torácica e critério de alto risco, conforme o estudo TATICS TIMI 18.

Onda T

  • Alteração primária: inversão simétrica.
  • Alteração secundária: inversão assimétrica.
  • Síndrome de Wellens.
  • Alteração inespecífica.

Avaliação de morte súbita

  • Fibrose / zonas inativas extensas
  • Dissincronia cardíaca.
  • Fenômeno R sobre T
  • Bloqueios trifásicos
  • BRE oculto (mascarado)
  • QT longo
  • Alternância de onda T
  • Padrão de Brugada
  • Onda épsilon.
  • Arritmias complexas de VE

Distúrbios hidroeletrolíticos

  • Hiperpotassemia: Onda T apiculada (em tenda) – IR
  • Hipopotassemia: achatamento de T – uso de diuréticos

Pré-excitação (W.P.W)

  • Direita
  • Esquerda
  • Postero-septal / lateral

Efeitos de medicamentos

  • Digitálicos (impregnação / intoxicação digitálica)
  • Antiarrítmicos (amiodarona, beta-bloqueadores)

Possível cálculo de fração de ejeção

  • Equação de Askenasi: R V1 a V6 + R aVL / aVF < 40 mm (FEVE < 45%)

Coração de atleta / vagotonia

 

Como pode-se perceber, a princípio a aplicação dos critérios eletrocardiográficos, nem sempre é fácil e exige uma rotina de treinos para que o conteúdo adquirido se torne de fácil entendimento e raciocínio lógico.

O básico que se espera do clínico em treinamento é que possa estabelecer:

  1. O ritmo correto,
  2. Identificar arritmias potencialmente fatais e de alto risco,
  3. Saber aplicar critérios de sobrecargas, especialmente HVE,
  4. Identificar os principais distúrbios de condução,
  5. Avaliar a presença de necrose, corrente de lesão e isquemia miocárdicas.

A discussão prática de eletrocardiogramas e casos clínicos, assim como o desenvolvimento de uma rotina de descrição, farão com que o treinamento se torne mais proveitoso. Quanto mais eletrocardiogramas forem vistos e laudados, seguindo-se a rotina pré-estabelecida, maiores as chances de aprendizagem.